O mestre do terror John Carpenter usa de efeitos especiais e muito suspense nesta versão arrepiante do clássico "O Monstro do Ático". No verão de 1982, um time de doze pesquisadores trabalha numa remota estação na Antártica e descobre um ser alienígena submerso na neve há mais de 100.000 anos. Descongelada, a criatura mutante possui a habilidade de duplicar e se transformar em seu hospedeiro, matando-o em seguida e espalhando o terror. O problema é descobrir quem é ser humano e quem é o possível alienígena.
"O Enigma de Outro Mundo" é um ótimo exemplo de como contar uma ótima história adaptando o terror cósmico não só para o cinema, como também para os dias atuais (ou, ao menos, atuais em sua data de lançamento). O problema de vários dos filmes que tentam se utilizar dessa temática para criar terror é que eles não entendem exatamente de onde vem o medo espacial e de quais artifícios tirar proveito para representa-lo da forma mais eficiente possível. John Carpenter, por outro lado, parece ter entendido. Como já dizia H.P. Lovecraft, pai do terror cósmico, "o mais antigo e mais forte de todos os medos é o medo do desconhecido".
Enquanto outros filmes mostram completamente suas criaturas e perdem tempo tentando explica-las em uma tentativa falha de instigar a admiração do público, este simplesmente a joga no meio dos personagens do filme e cria tensão a partir da falta de informações.
O que há de tão especial nessa criatura? Por que tantas pessoas morreram simplesmente pra tentar matá-lo? A trama já começa te provocando, e acompanhando os personagens, vamos aos poucos e em parte descobrindo sobre o que estamos lidando. Foco no "em parte", já que nem mesmo após ter assistido completamente você entende o que era.
Sim, há indícios de sua origem e hipóteses sobre como funciona o organismo, mas tais informações, além de serem obtidas apenas no meio da história, ainda são apenas pinceladas em meio a uma infinidade de possibilidades que ameaçam os personagens. O fato da criatura se modificar, ser uma forma de vida sem um corpo específico que se adapta conforme o ambiente, é algo que a torna imprevisível, e mesmo que seu visual seja extremamente utilizado para criar repulsa e ojeriza, ele ainda reserva inúmeras formas que, na simples possibilidade de surgirem, já causam medo.
Tendo criado uma ameaça que sirva bem ao propósito da história, nos deparamos com a segunda dificuldade envolvendo adaptações de terror cósmico: a já citada anteriormente ambientação contemporânea. Nos clássicos livros de H.P. Lovecraft, sempre que adentramos em uma história, ela se passa em uma época já distante. Apesar da maioria de seus contos serem contemporâneos ao ano em que foram escritos, eles adquiriram um valor artístico diferente com o passar dos anos. Enquanto para pessoas daquela época a falta de informações de fácil acesso e a dificuldade de compartilhamento era algo comum, para nós é algo difícil de se lidar. Atualmente, vivemos em um mundo onde tudo é super exposto e compartilhado, o que dilui parte do medo que compõe o terror cósmico.
Mas então como emular o sentimento do desconhecido e a solidão existencial que tais obras nos induzem a ter? Simples, condicione seus personagens a um ambiente diferente. O cenário da história de O Enigma de Outro Mundo não foi determinado a toa: um grupo de pesquisadores vivendo no ártico, sem acesso a comunicação e com interação limitada a seus próprios companheiros. São esses pontos que, de forma até mais importante do que a criatura, criam a tensão. Ainda assim, tensão por si só não compõe o terror cósmico. O que seria esse gênero se não fosse pela ameaça desconhecida?
É a junção de ambos os elementos que gera como resultado um filme que a todo momento te faz temer pelo que pode vir a ocorrer. A chance de qualquer um dos membros da equipe ser a criatura disfarçada é o principal elemento de tensão do filme. Como resultado, temos cenas extremamente agoniantes, sendo o ápice delas, na minha opinião, a que o personagem de Kurt Russel, MacReady, testa o sangue de todos para encontrar a duplicata.
Além das ferramentas de roteiro e da ótima direção, há, claro, os efeitos visuais. O ano é 1982, então a computação gráfica era simplesmente inviável. Logo, a única forma de construir a criatura era com efeitos práticos. Eu sinceramente não faço ideia de como conseguiram fazer aquilo, só sei que é incrível. Toda a textura, cor, movimentação e fluídos do monstro não só parecem extremamente plausíveis como também ajudam a te causar estranheza. Nesse quesito, o filme é simplesmente impecável.
Ainda assim, não considero esta uma obra perfeita. Apesar de possuir todo o necessário para te causar medo, ela falha um pouco na questão de personagens. As atuações são boas e a forma como o roteiro os utiliza no desenrolar de trama é ótima, mas senti falta de conhecer melhor a equipe. São muitos membros, e se você não souber previamente quantos são, isso acaba causando uma certa confusão. Eu frequentemente me pegava tentando ligar os nomes aos personagens e lembrar onde cada um deles se localizava, além de quais ainda estavam vivos. Claro, não é algo que estrague o filme, mas é um detalhe que eu senti bastante falta e me impede de dar uma nota mais alta (ainda que quatro estrelas seja algo considerável).
Apesar desse problema, os outros méritos do filme se sobressaem. Curiosidade, medo, perigo, tensão, nojo e repulsa são todos sentimentos que o filme inteligentemente utiliza para manipular o espectador. São eles que tornaram O Enigma de Outro Mundo o que é, até hoje, considerado um dos melhores filmes do subgênero de terror cósmico.
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